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Dreaming

Last night, I found myself dreaming of an unfamiliar place. In a dimly lit room, people were preparing to leave as the meeting concluded. Amidst the movement, I managed to recognize some of them, though only vaguely and without much clarity. However, I noticed a young woman whose face was clearly visible to me, and her smile seemed somewhat familiar. 

We began talking, and there was an exciting sense of complicity between us. As we grew closer, I found myself drawn to her natural charm. Believing our connection was mutual, I considered expressing my feelings to her. Yet, I hesitated, wondering if her empathy was directed towards me or if she was like this with everyone. 

I was at a standstill when I woke up. As I returned to reality, I pondered the meaning of that scene at the end of a sleepless night and after a stressful episode the previous day. The best explanation I could muster was that the woman embodied the final image of all the women I had encountered. Indeed, her visage was not strange at all. Although it did not characterize any specific woman, she might have been a blend of all of them. 

That daydream evoked the sensation of encountering someone I had known in the distant past, even though I no longer recalled what she was like. She rekindled cherished memories buried in my subconscious. Interestingly, the woman's thought-provoking vision was not without precedent. Therefore, the metaphor may not only pertain to the initial hypothesis but also serve as an allegory for past joys, offering comfort in the uncertain times of today.


            
          

Reverie - Debussy- 

Eugene Ormandy and the Philadelphia Orchestra

Fada

            Festiva fada de formosas feições,

qual frágil folha furta-cor flutuando

finta fantoches em fugazes  ficções

feliz, fortuita,  fagueira,  flertando...

 

A quem te fazia afago

fizeste forasteiro

que ferido, foge afinal

e fatalmente fenecerá

de afecção por falta de afeto

O afeto finalmente findará, é facto.

 

 

7/4/1999

Reminiscências I

         Olho a estante, onde à meia altura, estão dispostos álbuns de fotografias. Escolho um ao acaso. Ter o passado bem à minha frente...do mesmo jeito que já foram um dia, pessoas e lugares ali sobrevivem, resguardados no celulóide.

A foto mostra uma casa de fachada de azulejos coloridos com desenhos delicados e dizeres em espanhol. Junto ao portão, uma mulher jovem de sorriso espontâneo e ao mesmo tempo envergonhado, o que lhe dá um encanto incomum.

A imagem me conduz à estação ferroviária de Sevilha, no ano de 1986. Faltava pouco para as dez da noite quando desembarcamos. Depois de três dias viajando em vagões de segunda classe você acaba restringido suas ambições na vida a coisas simples como banho quente e cama. Eu receava não encontrar acomodação disponível para aquela noite, por isso, pedi que ela tomasse conta da bagagem enquanto iria atrás de um telefone.

Não haver turistas japoneses em volta era um fato positivo, pois eles sempre achavam os lugares mais baratos antes que nós. Em especial aqueles de calças curtas e mochila nas costas. Mas o guia Frommers indicava uma hospedaria no bairro judeu. Quarto duplo, “mobília charmosa”, com banho privativo, 20 dólares. Ótimo. Mas o telefone público não aceitava minha ficha ou provavelmente estava com defeito. Eu procurava manter a calma, quando me apareceu uma figura masculina insólita. De constituição miúda, era quase um anão. Seus olhinhos demonstravam uma vivacidade que não combinava com a textura da pele e a cor dos cabelos, já gastos pelo tempo. Nos primeiros filmes do Werner Herzog havia uma personagem muito parecida, quem sabe não seria ela própria? Sem dar importância à minha expressão de estranheza, tirou uma moeda do bolso e começou a pular na frente ao telefone na tentativa alcançá-lo. Ante a cena, pedi-lhe a moeda e desta vez consegui fazer a ligação. Quando me voltei para agradecer-lhe a gentileza, era tarde - ele havia desaparecido.

Uma hora depois, chegávamos à esquina de uma rua estreita do antigo bairro judeu Santa Cruz, na cidade velha. Ao fundo se avistava um luminoso que dizia: "Hotel Lyon". "É o tal", exclamei eu, satisfeito.

A “mobília charmosa” não passava de um armário escuro e carunchoso mais duas camas de solteiro com colchões de diferentes formatos: um era tão inclinado para um dos lados que a pessoa que se deitasse teria que se segurar bem para não rolar para o chão. O outro era de conformação côncava, de modo que uma pessoa deitada ficaria invisível aos olhos de quem estivesse na cama ao lado. 

- “É só por esta noite. E pense no banho quente que nos espera." disse eu, dirigindo-me à janela do quarto.

Àquela hora já não havia movimento nas ruas, mas os quintais das casas vizinhas despertavam a minha curiosidade. Entretido a olhar o casario, pareceu-me ouvir lá do banheiro ela pronunciar a palavra ‘gelo’.

Fui até lá verificar pessoalmente a temperatura da água. E na recepção nos disseram que havia água quente...

- "Ora, deve ser aquecimento central...demora um pouco, mas depois que esquenta é uma beleza!”- contemporizei. Ela respondeu que por nada no mundo entraria debaixo do chuveiro.

"...mas e os três dias sem banho?" continuei. Dizendo um gracejo qualquer, ela encerrou o assunto.

"Eu vou", disse eu, enquanto observava a minha mão direita que, após o teste da temperatura, adquirira uma coloração azulada.

 Afinal, a água fria, aquelas camas, o hotel e o cansaço eram detalhes que para mim pouco importavam, tantas eram as certezas que tínhamos e as coisas novas a descobrir!

 

                                            1999

TRIO BRASILEIRO Live at Empty Sea Studios - Aguenta Seu Fulgêncio (Jaco...


Sobre Emily Dickinson

Water, is taught by thirst
Land - by the Oceans passed
Transport - by throe -
Peace - by its battles told
Love, by Memorial mold 
Birds, by the Snow.


A água, se aprende pela sede
A Terra - pelos mares atravessados
O transporte, pelo sacolejar (O êxtase pela agonia)
A Paz, pelas batalhas vividas
O Amor,  pelos jazigos da memória
Os Pássaros, pela neve.

Estes versos foram escritos por Emily Dickinson, uma poetisa norte-americana que nasceu em 1830 e viveu 55 anos. Disseram que seu estilo denota uma mescla de puritana com livre pensadora.
            Praticamente autodidata em poesia (teria recebido influência de um praticante de escritório de advocacia e de um pároco), parece não ter recebido influência de nenhum escritor conhecido.
            Teve apenas dez poemas publicados em vida. Embora vissem originalidade em seus versos, os editores não os compreendiam bem - ela simplesmente fugia às regras de escrita que não combinassem com sua liberdade de expressão.
            Vivendo sempre na casa paterna, conheceu poucas cidades, mas sua imaginação percorreu temas de todos os tempos e lugares, amores platônicos, solidão...
            A primeira edição de sua obra foi publicada em 1890, quatro anos após sua morte, mas só em 1945 sua produção viria a ser conhecida. Há aproximadamente 1800 textos de sua autoria publicados.
            Este verso chamou-me a atenção quando assisti ao singular filme Rois & Reine, do diretor francês Arnaud Desplechin. Achei-o muito bom, não apenas pelo diretor e atores (Emmanuele Devos, Mathieu Amalric; Catherine Deneuve faz uma breve aparição)
, mas pela história, que tem em seu epílogo este poema. As traduções variam um pouco, o que não poderia ser de outro modo - cada idioma tem expressões peculiares que às vezes não podem ser transpostas para outros. Esta, que aparece no filme, foi a que achei mais bonita.

É interessante notar que a mensagem transmitida pelo poema (pelo menos como eu vejo), vai um pouco de encontro à filosofia de Nietzsche (1944 - 1900), que via o lado vantajoso do infortúnio e das dificuldades (e ele as teve enormes). Acreditava que estas seriam um mal necessário e que, se administradas com talento, poderiam gerar coisas belas e o fortalecimento.

A expectativa que cultivas

       Ao avançar agora algumas décadas surge-me a figura de uma moça de quem eu gostava. Feita da mistura incomum de pragmatismo e leveza, tinha um encanto psicológico que me atraia. Costumava dizer que não confiava em ninguém, nem nela própria. O tempo se encarregou com que eu viesse a concordar inteiramente com ela. Deve-se desistir diante das evidências que fazem a regra? 

        Lembro aqui da citação de JW Goethe, enfatizada pelo psiquiatra austríaco Viktor Frankl em sua busca por um sentido na vida: “If we take man as he is we make him worse, but if we take man as he should be we make him capable of becoming what he can be.” É uma máxima cuja validade temos oportunidades de testar no dia-a dia. Nessa empreitada, ficarei feliz se for bem-sucedido pelo menos uma vez...

        Da minha parte, não creio haver muito lugar para idealismos neste momento. No entanto, valendo-me ainda da alegoria ecológica, por vezes vejo-me a chafurdar, teimoso, em um pântano. Com o olhar atento, paciência e sorte, quem sabe não encontre alguma flor?

        “Tu te tornas eternamente decepcionado pela expectativa que cultivas" lembrava-me um amigo (hoje falecido) mágico das letras. Contrapondo-se à filosofia exuperyana, esta paródia revela sabedoria baseada na vivência prática com seres humanos. Seria o produto final de nossas idealizações. Por outro lado, penso que decepções podem servir também de matéria-prima para forjar a vontade de mudança. A forma para se fazer isso compete a cada um escolher. 

        Ao longo da vida doamos parte do nosso tempo e energia a pessoas nas quais acreditamos. Algumas poucas nos são gratas, por terem correspondido ao nosso empenho; mesmo estando fisicamente distantes nunca as esquecemos. Outras, com o tempo, afastam-se por não comungar mais das mesmas devoções — estas nos são indiferentes. E ainda há as que, dada sua carência de luz própria, guardam instintos predadores. Em geral, ocultam-se sob uma máscara de simpatia e efusividade. A elas dedico um pensamento de Schopenhauer. Este filósofo alemão dizia que toda a maldade, inveja e estupidez que tivemos que suportar não devem ser de modo algum atiradas ao vento, mas sim usados como alimenta misanthropiae e continuamente lembrados para sempre termos diante dos olhos a índole real dos homens, e não nos comprometermos de modo algum com eles.

        Finalizo com um trecho já mencionado de sua coletânea de escritos a respeito:  “Assim descobriremos que, de fato, frequentávamos há muitos anos aqueles com quem tivemos experiências desse gênero, sem os acreditarmos capazes disso. E, portanto, foi só a ocasião que os pôs em evidência. Ora, quando começamos a nos familiarizar com uma pessoa, devemos ter em mente que, caso a conhecêssemos mais intimamente, decerto a desprezaríamos ou teríamos que odiá-la.”

Glaciar

                                                       

Glaciar

 

Acostumar-se à latitude austral

E aos efeitos da hipotermia

Conservar-se em quietude e afinal

Retirar-se ao silêncio e à paralisia

 

Trafegar nas alturas das baixas temperaturas

Suportar a ardência aguda das rachaduras

 

Nem pálido nem violáceo, adotar o turquesa

Das águas cativas das montanhas claras

E como quartzo laminado, retratar a natureza

Das entidades que lhe são mais caras

 

Às vezes provar um trago de aguardente

Sonhar que é animal de sangue quente

Mais tarde, com um balde de água fria

Despertar, a face encostada na guia

Um breve, enganoso instante

                            Um breve, enganoso instante

            Embora lhe notasse a graça e a delicadeza, não a vislumbrara como uma mulher por quem um dia pudesse se interessar. Pois era o que vinha acontecendo desde que ela passara a lhe fazer companhia com suas conversas e livros.

            Conversavam sobre tudo - coisas importantes ou não, e as ideias fluíam bem. Estava sempre em dúvida e costumava dizer que não confiava em ninguém, nem nela própria. Mas onde encontrar alguém para discutir Saint-Exupéry (que não o Pequeno Príncipe), D.H. Lawrence, personagens da revolução francesa, e que tivesse lido o ‘Diário de Ana Maria’?

            Com o tempo, constatou que o material de que era feita - uma mistura incomum de pragmatismo e leveza - tinha um encanto psicológico que o atraía.

            Lembrou-se do fim de tarde em que ao sair do trabalho a avistou no ponto de ônibus, antes de um temporal que se anunciava. Movido por reflexo, parou e ofereceu-lhe carona. O vento que fazia voar as folhas das árvores e a visão quase onírica de sua figura - a pele muito branca, os cabelos anelados, revoltos, de uma cor incomum, que contrastava com tudo...ela aceitara e foram conversando, como se conhecessem de longo tempo.

            Um dia ele sentiu se aproximar o momento em que a mulher que lhe cativara iria embora. Anteviu então que não apenas aquele lugar, mas o mundo inteiro ficaria sem graça. Tomado por uma sensação amarga, mas ainda não de desalento, ele entendeu o que deveria dizer-lhe...

            O bar estava iluminado e quase vazio quando chegaram. Acomodaram-se, ela conduzida por palavras, ele por pensamentos. Em certo momento, percebendo uma brecha em meio à sua loquacidade, ele pediu-lhe alguma coisa...
            Calados, juntaram tacitamente as mãos e olharam-se nos olhos. Assim ficaram até que ele a puxou para si e seus lábios se encontraram – e então sentiu, visceralmente, o mesmo gosto e leveza que sentia quando conversavam.
            E à medida que lhe sobrevinham as sensações, ele pensava no epílogo de um conto de Tomas Mann: 
“Pois uma felicidade, um pequeno calafrio e atordoamento de felicidade toca o coração quando aqueles dois mundos entre os quais oscila nosso anseio se tocam por um breve, enganoso instante.”

 

     





        

Emmenez moi - Charles Aznavour



Vers les docks où le poids et l'ennui
Me courbent le dos
Ils arrivent le ventre alourdi
De fruits les bateaux

Ils viennent du bout du monde
Apportant avec eux
Des idées vagabondes
Aux reflets de ciels bleus
De mirages

Traînant un parfum poivré
De pays inconnus
Et d'éternels étés
Où l'on vit presque nus
Sur les plages

Moi qui n'ai connu toute ma vie
Que le ciel du nord
J'aimerais débarbouiller ce gris
En virant de bord

Emmenez-moi au bout de la terre
Emmenez-moi au pays des merveilles
Il me semble que la misère
Serait moins pénible au soleil

Dans les bars à la tombée du jour
Avec les marins
Quand on parle de filles et d'amour
Un verre à la main

Je perds la notion des choses
Et soudain ma pensée
M'enlève et me dépose
Un merveilleux été
Sur la grève

Où je vois tendant les bras
L'amour qui comme un fou
Court au devant de moi
Et je me pends au cou
De mon rêve

Quand les bars ferment, que les marins
Regagnent leur bord
Moi je rêve encore jusqu'au matin
Debout sur le port

Emmenez-moi au bout de la terre
Emmenez-moi au pays des merveilles
Il me semble que la misère
Serait moins pénible au soleil

Un beau jour sur un rafiot craquant
De la coque au pont
Pour partir je travaillerais dans
La soute à charbon

Prenant la route qui mène
A mes rêves d'enfant
Sur des îles lointaines
Où rien n'est important
Que de vivre

Où les filles alanguies
Vous ravissent le coeur
En tressant m'a t'on dit
De ces colliers de fleurs
Qui enivrent

Je fuirais laissant là mon passé
Sans aucun remord
Sans bagage et le coeur libéré
En chantant très fort

Emmenez-moi au bout de la terre
Emmenez-moi au pays des merveilles
Il me semble que la misère
Serait moins pénible au soleil

Emmenez-moi au bout de la terre
Emmenez-moi au pays des merveilles
Il me semble que la misère
Serait moins pénible au soleil